Qual será a gravidade desta crise? - Por #António Alçada
Aproveitei esta pergunta num debate que ouvi em plena pandemia na CNN em que um jovem economista defendia que a actual crise teria efeitos muito idênticos à de 2008, mas um economista mais experiente relembrou a Grande Depressão de 1929.
Procurei investigar um pouco sobre o que se terá levado à crise de 1929 e, todavia, não há consenso na comunidade dos estudiosos de economia.
Daí que tenha procurado o caminho do bom senso e ver, se de facto, a situação mundial poderá estar assim tão próxima de uma crise que contribui para um conflito como a II Grande Guerra. Penso que não!
Uma coisa todos estão de acordo, a situação social e política acabou por normalizar pese embora, até à data, a Grande Depressão, tenha sido o período mais longo da história da humanidade onde o chamado capitalismo viveu numa crise.
A génese, tudo indica, que a Europa deixou de importar dos EUA, principalmente produtos alimentares. Consequências: excesso de produção, baixa de preços por falta de procura, falências, subida do desemprego e queda das acções na Bolsa de Nova Iorque. A população ficou sem casa, passou fome e a criminalidade disparou.
A economia funcionava de modo livre e sem regulação, com base na lei do livre comércio.
O PIB mundial caiu entre 1929 e 1932, cerca de 15%.
Surgem as primeiras vozes, nomeadamente através de John Keynes, para que o Estado regulasse o papel social com o lucro dos privados.
O EUA bateram no fundo em 1933, já com o Presidente recém eleito Franklim Roosevelt, que propôs o «New Deal», com uma nova maneira de ver e fazer economia, mais concretamente macroeconomia.
Antes do «New Deal», com as políticas do anterior Presidente Hoover, foi feita uma aposta no proteccionismo limitando as importações através da imputação de taxas alfandegárias, tendo ficado na história pelo Alto Tarifário Smoot-Hawley.
O facto é que a resposta não tardou. E outros países que importavam dos EUA começaram igualmente a aplicar taxas alfandegárias fazendo baixar as exportações norte americanas, agravando a situação económica do país. O desemprego começou a galopar chegando a um terço da população activa, em 1933.
Com a eleição de Roosevelt, foi aprovado o «New Deal», que teve o apoio de economistas conceituados como Jonh Keynes, defensor de que o Estado tem de regular o papel social e os lucros dos privados. Isto significa que os ganhos da produtividade deveriam ser redistribuídos para o aumento do consumo, nem que fosse através de impostos.
As medidas do «New Deal», foram nesta linha, com o Estado a apoiar socialmente famílias e pessoas necessitadas, foram criados programas de emprego através de parcerias entre privados e o estado. Por outro lado a Administração americana sofreu uma profunda reforma tendo em conta não ter mecanismos de resposta para uma recessão.
Um bom exemplo foi a criação da «Federal Agency Relief Administration», criada em 1933, que seria responsável pelo fornecimento de fundos federais aos governos estatais, para que estes empregassem tais fundos em programas de ajuda social.
O investimento público foi outra aposta de forma a empregar trabalhadores nas áreas de infra-estructuras, escolas e hospitais. Estes projetos federais forneceram milhões de empregos aos necessitados, pese embora a taxa de desemprego não tivesse baixado para os níveis de 1930, ou seja 9%.
Relativamente à agricultura, onde a situação era bem mais dramática, foi criado o «Agricultural Adjustment Administration», com o objectivo de regular a produção de produtos agropecuários mas por cada unidade agrícola.
A questão do monopolismo, que em parte levou à queda de grandes impérios económicos com a Grande Depressão, estabeleceu no New Deal o «National Recovery Administration» que definiu salários mínimos, carga horária de trabalho e impedisse a criação de monopólios. Esta agência, uma autentica revolução nos EUA, foi entretanto encerrada em 1935.
Mas o papel da regulação foi essencial para tornar o Estado americano num estado moderno. Foram criadas entidades reguladoras para as transações bancárias e comercio bancário, comércio na bolsa de valores, impedindo compras de ações que lesassem o interesse público.
No que refere ao trabalho foi criado um órgão regulador de sindicatos, de protecção laboral e de atribuição de pensões mensais aos aposentados, bem como um apoio temporário aos desempregados.
As tarifas alfandegárias promulgadas por Hovver foram revogadas através da redução das taxas, e ao contrário do Reino Unido, os americanos abandoram o padrão -ouro fortalecendo o dólar americano que foi um dos factores da recuperação económica.
A queda do desemprego só foi definitivamente resolvida com a entrada na II Guerra Mundial.
Transpondo um pouco para a realidade actual, não deixa de ser preocupante, existirem diversos mecanismos de regulação, como pilares dos estados modernos, e os sistemas financeiros parecem sentir-se debilitados.
Por outro lado, se a Grande Depressão foi ultrapassada com medidas políticas, num contexto de mercado, para os diversos estados americanos, não se entende também tanto frenesim por parte da União Europeia, para que o dinheiro seja disponibilizado, mesmo de acordo com as actuais regras da dívida pública. Tal como nos EUA todo o dinheiro disponibilizado na economia permitiu um crescimento do produto através de aquisições às empresas. E desde muito cedo que, nós portugueses, entendemos quais os produtos que devemos de comprar com as ajudas financeiras que nos têm disponibilizado no quadro comunitário.
Basta consultar os relatórios do Banco de Portugal e ver os países que mais importamos e exportamos, desde 1987.
Achei interessante relembrar este episódio da nossa história mundial, julgo que bem pior que estes momentos que ainda vivemos, porque quando os políticos decidem os problemas resolvem-se.
António Alçada