Existe racionalidade nas bolsas? Porque sobem e baixam? - Por #Joaquim Marques
Sigo diariamente e permanentemente a evolução dos mercados bolsistas. Faço-o por razões profissionais, por razões privadas (dada a exposição), mas também com o intuito de entender a correlação entre a volatilidade dos mercados em relação à economia real.
Muitas conclusões e análises poderemos extrair do comportamento das bolsas. Mas se tivesse que definir uma só frase diria o seguinte:
«é possível gerir fundamentos, mas não é possível gerir emoções»
Existe, portanto, uma grande complexidade nos mercados financeiros. Dai que negociar é muito mais do que escolher ações!
Não existe nenhuma bola de cristal que nos indique quando é que as ações vão subir ao descer. Senão todos, ao mesmo tempo, investiriam e desinvestiriam. Ora, seria o colapso das bolsas. O que faz subir os títulos é quando a quantidade de pessoas que se dispõem a comprar é superior á quantidade de pessoas que no mesmo instante se predispõem a vender. As ações baixam quando acontece o inverso.
De notar que o valor nominal das ações (total do capital social da empresa a dividir pelo total das ações) é invariável. O valor de mercado ou capitalização bolsista de uma empresa é calculado pela mesma quantidade de ações a multiplicar pela cotação da ação. Isto quer dizer que a quantidade de ações é inalterável, o que significa que para uns ganharem outros têm que perder – a não ser que a tendência seja de permanente subida (algo que os mercados não confirmam)
Existem, no entanto, algumas “regras” que recomendo aos que pretendem este investimento de risco.
Nunca se devem contrariar as ondas. Porque não é possível. Se o fazemos isoladamente perdemos. Somos engolidos pela onda. Não temos força suficiente para remar em contra corrente.
Não podemos lutar contra o mercado, ele não faz a menor ideia se estamos a ganhar ou a perder. Muitos investidores negoceiam como se estivessem numa revolta constante quando estão a perder. O mercado não tem sentimentos. O mercado não é um adversário que nos esta a enganar.
É um erro pensarmos que quando um título já baixou muito é altura de comprar. Nada mais falacioso. Por mais que baixe, é sempre possível baixar mais ainda. Enquanto a onda está em desenvolvimento ela é imparável. Todos nos lembramos do exemplo do BCP. Os valores históricos registam uma amplitude entre os 200 contos e os …20 cêntimos! . No ano 2000 as ações valiam cerca de 25Euros, para hoje valerem menos de 10 cêntimos. É verdade que com todos os splits . Mas é elucidativo. Quantos de nós fomos tentados a entrar no mercado quando as ações valiam 10 Euros? e 5?e 2? …e 0,5? …todos perderam na ilusão do comprar barato, ou na queda - e perderam significativamente.
Voltando aos fundamentos e às emoções! Lembro-me que há uns anos atrás, as ações da Apple estavam de grande saúde. A tendência era de subida, dada a sua performance de crescimento e rentabilidade. No entanto, num determinado dia colapsaram. Por mais relatórios e opiniões que lia, a queda não se sustentava por nenhum evento indexado á empresa. Pelo contrário todas métricas eram positivas. Percebeu-se mais tarde que as ações caíram, porque um dos acionistas com grande peso na empresa decidiu a retirada da posição na Apple. E fê-lo, não por precaução ou desconfiança da companhia, mas porque precisava desse cash para resolver outros negócios em dificuldades! A sua retirada da Apple fez com que momentaneamente existisse uma grande pressão vendedora, fazendo cair os títulos.
Ora , a questão é : como é que um investidor se pode prevenir numa situação destas? Não pode. É impossível. Pois ninguém pode premeditar as emoções ou irracionalidade dos outros investidores.
Que outras dicas devemos ter presente ?
É necessário reavaliarmos permanentemente as nossa posições.
Se o fizermos com sentido critico, a nossa carteira agradecerá.
Muitas vezes os investidores ficam agarrados duma forma cega às suas posições. Isto acontece principalmente quando estão a perder, e se recusam a vender com menos-valias. Daí a pergunta que devemos fazer a nós próprios é : será que entraríamos num titulo, em queda, se não tivéssemos posição? Ou compraríamos outro título? Seguramente a segunda opção. É comum este pensamento do investidor: “ agora já que estou a perder tanto , não vou vender – elas subirão seguramente” – Esse é um erro fatal!
É normal em bolsa ganhar-se e perder-se ! Mas perder dinheiro por se ter negociado fora da lógica ou do seu método, é um erro imperdoável para qualquer investidor. Ao inverso, se tivermos fundamentos e convicções devemos, então, apostar numa posição forte.
Existe um outra problema: o vicio .
O vicio ocorre quando o desejo de negociar é superior ao desejo de ganhar dinheiro.
Não se deve estar nos mercados financeiros por adrenalina, mas sim para se ganhar dinheiro. Muitas vezes entramos nos mercados quando a razão e as probabilidades são baixas. Mas mesmo assim entramos, pela irreversível atração de negociar.
Ora, muitas vezes o segredo está em saber esperar. Ficar de braços cruzados á espera da oportunidade não deve ser um aborrecimento.
Um outro problema: a facilidade.
Hoje é muito fácil entrar na bolsa. Basta em um “double click” em uma qualquer plataforma home banking. Hoje, mais de 99% das transações são eletrónicas, e processadas em frações de segundo. Na maior parte já não existe a figura do corretor . Qualquer pessoa a partir de casa pode investir no Dow Jones, no S&P, no Nasdaq , ou no PSI20 - sem qualquer interferência humana. Aquela imagem histórica de ver em Wall Street os corretores exaltados com os braços levantados com ordens de títulos nas mãos, é hoje um anacronismo.
Este facilitismo leva a uma maior apetência pelo risco.
Esse facilitismo pode levar lucros rápidos quando o mercado está a negociar num “bull market”. Ora, este ganhar dinheiro rápido induz na ilusão de facilidade de gerar mais valias. O que leva á ganância. Mas quase sempre coincide com o próximo patamar: o “bear market” , que faz com que o investidor perca tudo o que ganhou , mais o que investiu. E aqui reside um dos grandes trunfos dos investidores sábios: a experiência.
Não são os pensamentos ou emoções que triunfam, mas sim negociar nas oportunidades. Pra isso é preciso estudar. Estudar, significa ler os relatórios trimestrais das empresas cotadas. Analisar e extrapolar as tendências de negócio, das companhias. Analisar a tendência “top and bottom line”.
Ter uma perceção do crescimento da empresa e principalmente do seu setor de atividade ( por exemplo, era notório, que com o lockdown e a crise atual, com muita gente a trabalhar a partir de casa , com os comportamentos a alterarem-se ,os vencedores seriam as empresas do setor tecnológico – lembro que o Nasdaq bate hoje records históricos nesta crise pandémica, enquanto os índices das empresas de setores tradicionais se afundam com esta crise)
Fazer uma analise o mais minuciosa possível em relação a ratios fundamentais nos mercados :
EPS (earnings per share) que traduz a relação entre os lucros de uma empresa e o valor das ações ( depende do setor de atividade, e do nível de investimento, mas é recomendável este valor ser superior a 10% )
PE ( price /earnings) traduz a relação entre o valor das ações e o lucro da empresa. Representa o valor que os investidores estão dispostos a pagar por cada dólar de lucro. Este ratio oferece uma melhor visão do potencial crescimento do título. Se este ratio for baixo, significa que as ações estão subvalorizadas ou com desconto, o que pode representar uma oportunidade de valorização, se a empresa tiver potencial de crescimento. No entanto existe um reverso da medalha, o baixo P/E pode traduzir um défice no potencial de crescimento, podendo as ações baixar mais ainda. O mais aconselhável, aqui, é comparar o P/E da empresa com a média do setor de atividade, e conferir o potencial de valorização.
Outras métricas e tendências que devem ser seguidas : EBITDA, Gross Profit Margin, Net profit Margin, ROE (return on equity)…
A política de dividendos é outro fator a ter em atenção. No entanto no dia de pagamento do dividendo as ações descontam tecnicamente esse valor.
Ter em conta as vendas a descoberto, é outro riso a ter em conta, que é uma aposta na quebra das ações, perante um ativo que não se detém, com o intuito de ser adquirido a um preço baixo e vende-lo com posteriores mais-valias. Este mecanismo acelera a queda das ações.
Ter em consideração os ciclos das empresas e as margens do mercado. Existem empresas nomeadamente do setor tecnológico onde as oscilações são significativas e indexadas ao período de vida dos produtos. Num ano as ações podem valer 3 vezes mais, ou o inverso.
E claro, ter em atenção todas as centenas de variáveis macro – económicas, que fazem com que num determinado dia ou período todos os títulos do planeta subam , mas também baixem.
Nas boas ou más notícias o segredo é a velocidade de reação. Como supostamente nenhum investidor tem uma informação privilegiada das cotadas ou dos governantes, resta-lhe reagir de imediato. Como se faz? Os resultados trimestrais das cotadas são divulgados quando o mercado está fechado. No entanto de imediato é possível seguir o “pre-market” ou “after-market”, que confere uma tendência antes da abertura. A sugestão é não hesitar. Vender se as noticias são negativas, mesmo que em baixa, e comprar de imediato quando as noticias são positivas mesmo que o titulo já esteja a valorizar – pois vai continuar a valorizar.
Pensar sempre desta forma: por mais que uma ação baixe , pode baixar sempre mais , e por mais que uma ação já tenha subido o potenciar poderá ser ainda muito elevado. Nunca contrariar as dinâmicas das ondas criadas.
Uma consideração máxima : nunca sustentar uma posição ou opção com esperança ou fé. Quando esses sentimentos vêm ao decima nos mercados, algo esta fundamentalmente errado.
A esperança e a fé são palavras fortes que fazem mover os seres humanos. Nada contra. Mas no mundo dos mercados são autênticas setas a indiciar o precipício.
P.S. : (Não abordei neste texto os comportamentos dos mercados, face á brutalidade desta crise. Fá-lo-ei em breve com a tónica factual de o índice tecnológico Nasdaq bater recordes históricos , perante a pior crise da historia. Interessante perceber porquê !
Importante ainda o enquadramento com a eleição americana em Novembro)
Joaquim Marques